Silêncio. Nesta casa não se é permitido falar.
Silêncio em respeito às cadeias que cancelam meu interior.
Silêncio em respeito aos telhados, iludidos e infecundos, que
asfixiam a minha sombra.
Silêncio sob o outeiro das feridas, das minhas feridas, que ninguém
ousa olhar.
Silêncio sobre mim,
porque no deserto não se perpetua o som, a raiz ou a choupana.
Porque tudo escapa e resiste,
mas tudo no deserto é o próprio deserto,
atordoado e perene na
dor das minhas carniçarias.
Silêncio mórbido, silêncio disléxico, silêncio declamado.
O mundo entupiu ante a minha vida
e fique a rendilhar as horas,
a lanhar cantos,
a romper carnes
para permitir que todo meu som ecoasse pelos panos rotos de minh’alma
exaurindo minhas possibilidades, levando consigo a mim mesmo.
Silêncio. Nesta alma não se lava roupa.
Silêncio em respeito ao ouro que deixei que levassem.
Silêncio nos porões dos olhos, dos meus olhos, náufragos.
(Adriano Gentil)